Poetas de Pernambuco

Poetas de Pernambuco

Poetas de Pernambuco

A categoria Poetas de Pernambuco reúne escritores e escritoras que representam a poesia e a cultura de Pernambuco. Aqui, destacamos poetas pernambucanos que traduzem em versos a riqueza cultural, as histórias e as tradições de Pernambuco. Descubra escritores contemporâneos que nasceram ou se radicaram em Pernambuco, celebrando a essência literária desse Estado tão vibrante.

Adriana Carneiro (Recife) é formada em dança (Konservatorium der Stadt Wien /Áustria), Letras (UNICAP) e especializada no ensino do alemão (Friedrich-Schiller-Universität Jena/ALE). Publicou a obra “O corpo como parte de um sistema” (Patuá, 2023). O que move seus poemas não é o corpo; porém, são o ser humano, a natureza e seus atributos.

Poesia

VIGOR

o corpo celebra a cada desejo correspondido
não é tão fácil compreender a manipulação da mente sobre o que ele sente
vigor é amalgamar corpo e mente e deixá-lo ser no seu tempo
ele nasce, cresce e quer amar eternamente
como se o amanhã fosse sempre o hoje
como se o vigor fosse para sempre
um corpo que pensa assim é potente
não se deixa vencer facilmente
ele é jovem incessantemente
desde que foi uma semente
que no útero eclodiu
de um encontro de vigor de duas vidas

 

Poema da obra O corpo como parte de um sistema
(Editora Patuá/SP, 2023)

Hevi Livre

Hevi Livre é natural de Recife. Graduada em Ciências pela Universidade Federal de Pernambuco – UFPE. Detém um olhar observador e atento às complexidades das relações humanas e sua relação íntima com psiquê humana. Sua paixão pelas palavras e pela literatura permite a transmutação de sua observação em poemas belos e ricos de significados.

Poesia

ÚLTIMO ATO

É causticante o jugo que incide sobre minha ancestralidade
Meu corpo marcado é apontado pela chancela do poder
Condenado pelo disparate de ousar ser
E ser petulantemente orgulhoso do distintivo da raça
Este que me borbulha o sangue nas veias
Você, embranquecido gradualmente em sangue, suor e lágrimas
Sobretudo afeito ao recalque da etiqueta marrom
Qual tom de pele não se veste
Frivolamente se reveste ao intencionar com manejo
O resgate do poderio armado sob o qual nos vergamos aprisionados
Depara-se decepcionado com a bravura arguta
Insolente desenvoltura de resistência digna
Fecundada na fé, no axé, na alegria pulsante de nossas almas
É teu último ato e o teatro está lotado
O tom da pele que te laqueia, clareia
Nu é um retrato devastado
Em cima do palco montado pela comicidade
Com a qual caminhamos até o resgate
De nossa face
Na nossa arte
Nosso espetáculo de vida
Para todo pertencer que não se abate

É homem bicha-bicho instinto — como se descreve em seu primeiro livro, Máscaras que Caem do Teto, publicado pela Editora Urutau em 2024. Nascido em Tracunhaém, na Mata Norte de Pernambuco, vive há 15 anos no Recife. Administrador e pós-graduado em Gestão de Pessoas, é apaixonado por literatura desde a adolescência e poeta desde o primeiro choro.

Poesia

Torda

Gostaria de não ser
tão saudosista ou tão magoatista.
Mas há um engenho
doce em meus lábios
e violento nas minhas lágrimas.

Rude em minha fala
de homem caboclo,
um mamulengo de pau erguido,
um veado crescido.

Manipulado pelas mãos por trás da torda,
de quem desejou um dia
ser o dono daqueles engenhos.
Mas, coitado…
o controle do mamulengueiro
pra eu não ser veado.
Mas, se eu for,
é só ninguém saber —
e só ele me comer.

Abro a boca, mas não digo.
Encerra a cena
com o pau atravessado
na minha goela-fala.

Maria José de Melo

Maria José de Melo é natural de São Caitano, município do Agreste de Pernambuco e atualmente reside em Jaboatão dos Guararapes (PE). É escritora, geógrafa, colunista e poetisa. Autora do livro: A Renda Fundiária na transposição do Rio São Francisco (Índica/2021) e A Jitirana Poética (Toma Aí Um Poema/2023).

Poesia

RECIFE DO MANGUE BEAT

Recife é a Veneza Brasileira
Com suas belas pontes
Expendida na beleza
Do encontro do rio com o mar
Recife, berço cultural na tradição nordestina
Nas veredas da poesia popular
Ela é braba e regional

Recife, na inconformidade de uma cidade lama
Na insularidade social, fez-se ilha e desigualdade
Recife se fez ponte sobre o mangue
Enaltecido no ritmo, no som e na melodia
Do Mangue Beat

O caranguejo com cérebro
Anunciou miséria e caos
Fruto de um movimento vivo
O manifesto que misturou o tradicional com o moderno
Assim, Recife deixou de ser marasmo cultural

Recife, poesia viva
No circuito regional e universal de
Naná Vasconcelos, Luiz Gonzaga, Ariano Suassuna,
Clarice Lispector, Celina de Holanda,
Joaquim Cardoso e cia
Assim, nossa identidade nos faz regionalista.

Marison Ranieri

Com graduação em Letras e pós em Escrita Criativa, Marison Ranieri tem publicações em revistas literárias e acumula seleções em prêmios literários e antologias. Em 2024, publicou “Meu corpo é lar de absurdos” pela Editora Flyve. Sua escrita quase sempre se mistura ao mormaço de Recife.

Poesia

No espaço, ninguém pode te ouvir rimar

Anos-luz diante de mim,
Se houvesse quem ouvisse,
Até a sinapse ecoaria
E mais alto eu pensaria
Se alguém reclamasse.
Se houvesse quem ouvisse,
E quisesse meu mal, faminto,
Com forquilhas de afeto,
Eu percorreria galáxias frente e verso,
Posto que não sou extinto.
Se houvesse quem ouvisse,
Eu saudaria este canalha
Com as mãos na garganta,
E o detestaria com o amor de um pai
Que atira os piores adjetivos ao filho,
Mas jamais o abandonaria,
Pois sabe que o silêncio,
Este buraco negro,
Devora mais que o ódio.

Nasceu em Olinda, Pernambuco. Bacharel em Direito e em Economia e com especialização em Planejamento e Gestão Pública. Atualmente trabalha como servidor público federal. Teve poemas e contos selecionados em diversas antologias. É autor da ficção científica “A Dinâmica Orgânica”, Ed. Ibis Libris, 2024.

Poesia

MÉRITO E MENDICÂNCIA

Havia sido um pobre e simples cristão
Mas você exige grandeza dos homens
Nada poderia querer de um simplório
Embora do seu amor em vão imploro
Porém, da paixão que recebo as ordens
Sim, tolo que sou, mas que coração!

Corri em busca de glória e de riqueza
Com desejo ardente e vontade forte
Cobri-me de título e de medalha
Empreendi, menti, lucrei às custas da alma
Levei a inimigos perigo de morte
Implacável, por cima, virei a mesa

Ouça então esta súplica, por favor
Eu assim mereço que me corresponda
Pois tudo que tinha ao meu alcance fiz
Consegui obstinado o que sempre quis
Rogo para que logo me responda
Tornei-me agora digno do seu amor?

Túlio Velho Barreto

Túlio Velho Barreto participou de dezenas de antologias e coletâneas de poesia e contos. Recentemente, publicou os livros Do Estar no Ainda – Haikais (Patuá, 2022), Versos em Cordas Primas (Helvetia, 2023), premiado pelo Festival de Poesia de Lisboa, e Pequeninos Animais em Haikais, (Patuá, 2024), voltado para o público infantil. Em 2025, foi 1º lugar no Prêmio Off Flip de Literatura com o conto “A Invenção de Fernando Pessoa”. 

Poesia

MÁQUINA DE ESCREVER

[Impassível]
Diante de mim pareces esconder segredos
a revelar – tarde ou cedo – o que não se sabe.
Antes do fim.

[O suave toque]
No deslizar dos dedos sobre a matéria
escreves a palavra séria que nunca se prende.
Nem se perde.

[No mesmo som]
Repetido em cada movimento faz-se
então a marca na face do branco absoluto.
Como um rito.

[Resultado:]
Em linhas retas apoia-se a musculatura
do escriba. E os traços espalham-se plenos.
Em mil planos.

[Poema e prosas]
As palavras que ali pousam vão até onde
as mãos alcançam quando a mecânica para.
E então calas.

O OLHO DO MAR

o olho do mar
atravessa
a praia
alcança espumas
acaricia
lambe
beija a areia
a seduz
quando clareia
a sob a lua
se divide
se multiplica
em leve flerte
e reflete
tudo o que mira
como o sol
da manhã
e da tarde
para apenas
à noite revelar:
o olho do mar
é farol

Vanessa Valentim

Vanessa Valentim é docente, licenciada em Letras, especialista em fonética e fonologia, mestranda em Literatura em Língua Estrangeira e Literatura Comparada. Educadora, pesquisadora e inquieta. Amante dos seres vivos. De pequena queria ser professora, brincava de dar aulas, ensinava suas pequenas sabedorias.

Poesia

Quando o telefone vibra

Um chá preto
descansa na xícara com desenho de um elefante.
O telefone vibra insistentemente.

Tocar jamais,
essas musiquinhas
não combinam com a rotina já estridente.

Notícia que chega vibrando
segue vibrando e ecoando
do estômago até o pescoço.
Harmoniza com aquele retrogosto
amargo da infusão esquecida.

O sofrimento flutua,
não sabe nadar.

A única boia;
respirar.

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