Poetas Mulheres

A categoria Poetas Mulheres destaca as vozes das poetas brasileiras. Descubra suas obras, histórias e celebre a força da poesia feminina.
- Minas Gerais, Mulher, Pessoa Negra/Preta, poeta contemporâneo, poeta vivo
Adriene Cruz é natural de Varginha-MG, Especialista em Produção Textual, Licenciada em Letras – Português, atua como Professora na Educação Básica. Autora do livro Paisagens Interiores – Editora TAUP. Acredita no poder da escrita como uma das formas de cura das emoções.
Mulher de Março
Eu não tenho culpa
Ninguém tem culpa
Sou como sou
Pertenço à família dos Sentimentos
Meu sobrenome é Intensidade.
Me ame ou me deixe
A escolha é sua
Mas não me peça
Para dissimular o que sinto.
Meu corpo conduz as águas
Que dos meus olhos escorrem lentas, fluidas.
Que no meu interior,
Quando querem amar
Revolvem-se como as ondas do mar…
Frescor
Repouso
Regalo
O que toca minha pele
Também vibra em minha alma
Assim,
Sou como sou
Pertenço à família dos Sentimentos
Meu sobrenome é Intensidade.
- alagoas, Mulher, poeta contemporâneo, poeta vivo
É uma amante da poesia.
pretendo-me jatobá
percebo-me trilho
busco estação horizontina
alvorada e ocaso infinitos
pedes-me movimento
não me mexo
declamas lâminas em versos
rompo minha castanha casca
nunca estive inteira
exige-me a vida poesia
contemporânea
um eterno brotar em bambu
- Mulher, Pessoa Autista, Pessoa com Deficiência, Pessoa com Experiência de Violência Sexual, Pessoa de Origem Latino-Americana, Pessoa Gorda, Pessoa LGBTQIA+, Pessoa Neurodivergente, poeta contemporâneo, poeta vivo, Rio de Janeiro
Nascida em 2002, no Rio de Janeiro. Algumas coisas me definem: uma longa batalha contra a doença mental, a sobrevivência às violências sexuais, e a deficiência. Não mais do que tudo e todos que amo. Sinto saudade. Ponto. Saudade de tudo. Aquele misto de afeto com dor, sabe? Acho que se eu fosse um sentimento, é este que eu seria. Talvez, eu já seja. Candura — uma história de sobrevivência feminina, é seu livro de estreia (TAUP, 2025).
só vou morrer
depois que
uma voz gasta
rouca
e sem dono
escorrer boca afora
a mesma boca
que quando esperava um primeiro beijo
foi usada de tantas outras maneiras
e ficou com um não regurgitado na garganta
sem cuspe
que esta boca
espante toda
palavra morta
e parte imunda
que entala como grão de areia após a praia
em quinas sombrias da sala de estar
vou urrar até a dor se render
até minha voz virar eco
e eu rasgar
cada caco de mim
que se culpa
por homens que tomam corpos
e brotam dores
só saio dessa vida
com a garganta em carne viva
- Mulher, Pessoa de Origem Latino-Americana, Pessoa Neurodivergente, poeta contemporâneo, poeta vivo, São Paulo
Amélia Greier recebeu a medalha Adélia Prado da AFEMIL em 2019. Em 2021, participou da publicação do livro “(Con)ciência. Historias de la ciencia brasileña”, promovido pela Universidade de Salamanca em parceria com a FIOCRUZ. Em 2024, venceu o 2º Concurso de Contos PodLetras com o conto “Pano de Fundo”.
Conjugação
Amor nascido às avessas
Tu nasceste primeiro, e eu vim após
Paixão reta, de morfologia travessa
Ele foi pioneiro, e eu nasci sendo nós
Desde o início, indicativos
Olhares, mãos dadas, sorrisos e beijos
Juntos regíamos todos os substantivos
E fizemos histórias conjugando desejos
Então, o sentimento ficou abundante
Paixão invariável, desatino imperativo
Mais-que-perfeito, foras meu modo mais excitante
Na tua presença, tudo era intransitivo
Passados tantos tempos, perdemos os adjetivos
De todos os predicados, só sobrou nossa ligação
Querido, não deixemos nosso amor no subjuntivo
Transformemos todas as sentenças em linda oração
Pois, de primeira, amar foi a mais linda surpresa
Depois, viver contigo foi pura emoção
Se o sentimento é tão lindo quanto a língua portuguesa
Ao invés de partir, façamos do amor a derradeira conjugação
- Mulher, Paraná, poeta contemporâneo, poeta vivo
Ana Gabardo é psicanalista e pedagoga, mora em Curitiba/PR e escreve desde que se lembra de ser gente. Desde cedo, reconhece o imenso compromisso e afeto com as palavras, que para ela são um modo de sobrevivência e de embelezamento da vida. Ela alimenta cotidianamente seu blog (https://www.sonhosemergentes.com/) com escritos sobre a vida e a morte, sobre os mergulhos e as dores e, às vezes, com um pouco de humor.
9 terça-feira
vamos desenrolar essas e outras histórias?
(tensão
estômago cimentado
desde então
não como
e eu que achei que já vivia
a minha
melhor história
ou melhor dizendo
a minha única história possível
como pode uma única pergunta
abrir uma fenda?
encarei a fenda
para ver
o que tinha dentro
era interesse)
- Mulher, Pessoa de Origem Latino-Americana, Pessoa Imigrante ou Refugiada, Pessoa migrante brasileira no exterior, poeta contemporâneo, poeta no exterior, poeta vivo, suíça
Andréa Zemp Nascimento é mãe, poeta, artista-educadora e arquiteta. É autora de “A criança e o arquiteto: quem aprende com quem?” (Annablume; FAPESP, 2015), de “tecedeira, com verso…” (Helvetia Éditions, 2024) e de “nascimento constante”, em co-autoria com Paula Constante (TAUP, 2025). Um de seus poemas é destaque do Prêmio Off Flip 2025.
pélago
ilhada em ferida
não mais em carne viva
deito os cílios
às margens da casca
e vejo:
a pele é vasta
eras eros
verso é fio
fruto que flui
escuto o que fui
imito outras eras
aproprio-me do fio
não pra compor uma reta
espiral é o que me interessa
espiral da espera à vera
ou então torno-me hera
espraio-me desenfreada
ousada em camadas
agarro-me a peles diversas
quimeras
lisas ásperas
efêmeras vésperas
que reverbero
eco pleno e sincero
é no espontâneo que opero
energia incontida de eros
- Mulher, Pessoa com Experiência de Luto, Pessoa LGBTQIA+, poeta contemporâneo, poeta vivo, Rio de Janeiro
Nasceu no Rio de Janeiro em 2000. Poeta e pesquisadora, é formada em letras pela Univates. Seu trabalho envolve autoras brasileiras com o projeto de clube de leitura Amavisse, também possui o perfil literário @leituramista onde fala sobre livros escritos por mulheres.
Saudade
te sinto aqui ainda, enroscada nos meus pés
na minha visão periférica, ainda vejo você caminhar por mim,
uma sombra, um pulo
eu giro a cadeira, você não está.
acho que te ouvi, mas não te encontro
como faço pra te encontrar além dos meus sonhos?
te sinto aqui ainda, fico aliviada
por um momento e depois, não mais.
a saudade me come pelas beiradas
ainda sinto teu cheiro
ainda te espero,
apesar de saber que você não vai voltar
e eu sei onde está.
eu olho a janela, sinto um vento.
durmo torcendo
te ver de alguma forma,
a cama ainda está morna.
a saudade me arrebata a cada roupa que visto
toco em um pouco de você a cada pelo que encontro
o que me restou da saudade:
uma foto sua e uma tatuagem.
ainda te sinto aqui
você me sente, daí?
- Mulher, Pessoa Assexual, Pessoa de Origem Latino-Americana, Pessoa LGBTQIA+, poeta contemporâneo, poeta vivo, São Paulo
Bia Viana é escritora, jornalista e comunicadora. Autora da obra “A mulher jornalista no cinema” (2020) e coautora da antologia “Publicar é um Direito” (2023), escreve sobre comunicação, gênero e cultura. Foi delegada em evento na ONU pelos direitos das mulheres e atua internacionalmente em projetos sociais. Está nas redes como @btrzviana.
Pronome próprio, incomum
Um dia, terei minha própria casa
Minhas próprias coisas
Meu próprio jazz, tocando em meu próprio rádio
De meu próprio gosto
Acompanhado do próprio vinho, barato
Aquele que eu mais gosto
Que a gente sempre compra em três garrafas quando vai ao mercado
Com meus próprios pés, descalços
E minhas próprias mãos, segurando duas taças
Uma de cada lado
Um tinto e um rosé, para aproveitar os dois gostos
Também podem ser duas cervejas
Tudo depende do próprio momento, claro
E vou dançar no meu próprio tapete aveludado
Debaixo de meu próprio teto
Com o volume inapropriadamente alto
Para a hora de ser eu própria
Que será, espero, toda hora
Ah, como eu quero ser própria.
- Mulher, poeta contemporâneo, poeta vivo, São Paulo
Formada em direito em São Paulo e linguística em Berlim. Escreve prosa e poesia. Possui textos em antologias e revistas literárias. Publicou dois livros de poesia: Jipe Amarelo, Folheando, 2023 e Um milímetro e meio, TAUP, 2023 e um de contos: Pard’olhos, Folheando, 2024.
Samstag
a mulher sentada no banco do parque esperando que sua espera acabasse
ouvia liszt saindo das mãos do jovem ao piano enquanto o sorvete com chocolate e pistache quase esquecido pelos ouvidos pingava na barra da sua saia.
ela não veria a mancha e a espera acabar
a chuva batia forte no vidro do carro. para-brisas
corriam sem completar o parar
debussy repetia a palavra como se fosse íntima
tal não soubesse diferenciar um ré de um fá
tinha importância? restava o sol
chave de claude
na estrada perde-se a faixa
o pensamento foge do foco
vapor de água
embaça o vidro
sem mãos para
esfregar
meu sorvete era baunilha
- Mulher, Pessoa de Origem Latino-Americana, Pessoa LGBTQIA+, poeta contemporâneo, poeta vivo, São Paulo
A escrita de Carolina Ana é uma constante busca por pertencimento, expressando incômodos e reflexões. Inspirada em questões filosóficas, espirituais, ancestrais e LGBTQIA+, ela mergulha em temas como vida, morte, amor e desejo. Com formação em comunicação e especialização em escrita criativa, sua voz singular ecoa através das palavras. @carolina.ana.oz
Iansã & Ossaim
Ocupo espaço, mas não sei onde estou
Moro em dois lugares, mas não moro em lugar nenhum
Corro, percorro, viajo com o vento
Não sei onde quero estar
Talvez a vontade de estar em todos os lugares
Me atrapalhe em permanecer
Tenho a sede do encontro
Tenho a sede da troca, mas nem todos entendem
Na verdade, quase ninguém entende
Será que alguém já entendeu?
Ofereço a troca, mas logo vou me embora
Sem ofensas, não tente me prender
Vento não se prende
O dono desse vento mora nas florestas
Ele também prefere estar sozinho
É por isso que ele é o dono
Ele nunca tentou me prender
E eu sempre ventei ao seu lado
Mesmo sem seu pedido
Mesmo sem seu consentimento
Sempre o protegi de si mesmo
Afinal, o vento é transparente